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quarta-feira, 16 de maio de 2012

Quinquagésima Primeira Carta: Espelho

"Eles te deram um olhar tão triste e essa feição perturbada se prendeu em ti, tão agarrada que mal consegue ficar mais de um minuto sequer sem tê-la ocupando seu rosto. É uma feição amargurada, melancólica, desgraçada, a reflexão quase imediata de um insolente desvio nos lábios. Já se sabe que a luz não vai de um ponto ao outro no espaço de modo instantâneo. A luz tem a sua velocidade e a Física explica isso. E então é exato, a luz simplesmente vem de onde tem de vir, se choca na superfície quase lisa do espelho e volta para os seus. E então você vê o que acha que todo espelho mostra: a imagem do momento. Mas, na verdade, essa imagem passou. Tendo a luz demorado um tempo para percorrer o campo da fonte até o espelho e do espelho até a retina ocular, a imagem que se vê pertenceu a um momento passado, a algo que já aconteceu, simplesmente pela luz ter uma velocidade. Você pode mover todo o corpo na frente do espelho e achar que ele está fazendo os mesmos movimentos que seu corpo faz no mesmo momento em que faz, mas na verdade, a luz chegou atrasada aos seus olhos e lhe mostrou um vislumbre do passado, uma imagem sem um diferencial perceptível, por isso parecendo ser de um momento atual. Apesar do atraso do caminho a se percorrer, é tão rápido, a diferença é tão mínima, que mal parece ter alguma mudança. De um modo informal, o espelho é a máquina do tempo mais simples, direta, antiga e triste que existe... Então, mude. Veja que a tristeza pertenceu ao passado e sorria - a imagem de um sorriso repetido do passado será muito mais agradável... embora 'castigadoramente' eloquente e miseravelmente ilusória."

Cartas Diretas, 
obrigado.

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